Doutoranda examina se a presença de moléculas do sistema imunológico no sangue ajuda a prever a eficácia do tratamento do câncer de mama triplo-negativo, um dos tumores mais agressivos entre mulheres de 20 a 40 anos.
A incerteza quanto à eficácia do tratamento é uma das maiores angústias que procedimentos oncológicos trazem a pacientes e seus familiares. Embora médicos especialistas avaliem uma série de fatores para determinação da terapia mais apropriada a cada paciente — como local e estágio do câncer, perfil imunológico, estilo de vida e características genéticas —, a prescrição nem sempre é precisa.
Por outro lado, a imprevisibilidade de resposta a tratamentos tumorais poderá se tornar cada vez menos recorrente, assim como indicam os resultados de um estudo realizado com foco em câncer de mama triplo-negativo (CMTN). E isso é, sem dúvida, uma boa notícia.
Esse subtipo tumoral, cujas células não apresentam os três receptores hormonais que participam da classificação dos cânceres de mama (estrogênio, progesterona e HER2), é um dos mais agressivos e corresponde de 10% a 17% dos casos de carcinomas mamários, com maior prevalência em mulheres entre 20 e 40 anos.
Ananda Lopes, doutoranda em Imuno-Oncologia no A.C.Camargo Cancer Center (ACCCC) em colaboração com o Centro de Pesquisa em Imuno-Oncologia (CRIO) no Einstein, vem investigando como a quantidade de moléculas de defesa do corpo podem prever a resposta a terapias pré-operatórias (neoadjuvantes) em pacientes com CMTN.
“A grande pergunta do nosso projeto é se a gente pode prever quais pacientes se beneficiariam com o tratamento quimioterápico, e quais se beneficiariam com a imunoterapia”, comentou Lopes em entrevista ao podcast.
Quando o sistema imunológico fornece pistas
Em 2021, pesquisadores da ACCCC, Fundação Oswaldo Cruz – Instituto René Rachou e Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Oncogenômica, trabalharam juntos em uma investigação inicial. Eles analisaram o sangue de 39 mulheres imunologicamente saudáveis (com média de idade de 41 anos, sendo 18 delas respondentes à terapia) que foram diagnosticadas com CMTN não metastático (sem dispersão corporal). Essas mulheres passaram por quimioterapia antes da cirurgia e radioterapia.
Os pesquisadores identificaram que a quantidade de citocinas positivas (proteínas que regulam a resposta imunológica) presentes no plasma das participantes antes do tratamento puderam refletir o estado do sistema imunológico, além de fornecer indicadores para prever a resposta à terapia e a sobrevivência. Além disso, a presença de células imunes (linfócitos infiltrantes de tumor) no momento do diagnóstico também influencia a resposta ao tratamento.
“Se a gente pudesse prever o desfecho clínico, isto é, a resposta patológica completa ao tratamento, isso permitiria propor tratamentos mais direcionados a cada paciente.
De acordo com Lopes, essa abordagem antecipatória não invasiva, por meio da coleta de sangue, poderia evitar tratamentos agressivos, demorados e caros que podem não ser eficazes para pacientes. “Identificando quais moléculas estão ali relacionadas com o sistema imunológico que ajudam a responder ao tratamento, provavelmente conseguiremos categorizar os pacientes em grupos conforme a maior expressão de moléculas X ou Y. Isso também ajuda a definir quais tipos de procedimentos serão os mais adequados para cada perfil imunológico, como cirurgia, quimioterapia e/ou imunoterapia”, completa a cientista.
Contribuições para a imunoterapia
A identificação do perfil imunológico no momento do diagnóstico também poderá favorecer na predição de tratamentos baseados na imunoterapia. No Brasil, o tratamento mais convencional em casos de CMTN ainda se baseia na quimioterapia citotóxica (fármacos que interferem na capacidade de divisão e crescimento celular), que apresenta uma taxa de resposta de 40-60%. Pacientes não-respondedoras à quimioterapia podem desenvolver metástase, e cerca de 30% dessas pessoas tendem a não sobreviver nos cinco anos seguintes.
A imunoterapia, autorizada em 2022 para tratamentos de CMTN, por outro lado, trata-se de uma modalidade terapêutica recente que visa a ativação do sistema imunológico para identificação e combate das células cancerígenas. Traços imunológicos identificados em pacientes poderão apresentar, portanto, pistas que poderão facilitar o trabalho do oncologista na prescrição de medicamentos imunoterápicos.
Embora a imunoterapia tenha trazido resultados promissores nos últimos anos, seu acesso ainda é limitado devido aos altos custos dos remédios, além de trazer efeitos colaterais, que podem ser leves ou severos. E esse é um importante ponto que também é contemplado na pesquisa de Lopes: “Um dos estudos do nosso grupo é entender o que está relacionado com esses eventos adversos. Por que alguns pacientes que respondem à imunoterapia desenvolvem um evento adverso ou não? (…). Então, não só nosso grupo visa identificar o tratamento individualizado, mas o bem-estar da paciente, evitando esses efeitos adversos”.
A presente pesquisa prevê a condução de novas coletas com maior número de participantes para verificar se os resultados obtidos em 2021 podem ser replicados, além de alcançar maiores evidências acerca dos perfis imunológicos das pacientes analisadas. Lopes e sua equipe acreditam que a pesquisa não apenas contribuirá na predição de tratamentos para CMTN, mas que a identificação de células imunes circulantes em mulheres com a doença também poderá auxiliar no tratamento de outros cânceres, que podem apresentar os mesmos tipos celulares.
É inegável o longo caminho que os pesquisadores ainda têm na obtenção de resultados mais concretos, mas a jornada está sendo realizada com passos cada vez mais precisos.
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Que saber mais?
🎧 Ouça a entrevista no Imuno Agentes Podcast:
Ep. 1 – Predição de tratamento em Câncer de Mama Triplo Negativo (com Ananda Lopes)
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