Investigação mira no uso da imunoterapia para tratamento de câncer de pulmão de células não pequenas

Pesquisadora busca identificar características em pacientes com este tipo de câncer que possam prever a eficácia da terapia.

imagem mostra a pesquisadora Thaís Ferreira no centro de pesquisa Albert Einstein
Thaís Ferreira, mestranda no Einstein e membro CRIO: projeto avalia perfil imune de pacientes com câncer de pulmão para prever resposta à imunoterapia. Foto: Rogério Bordini.

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ão é novidade que o Brasil é exemplo mundial na redução dos casos de câncer de pulmão decorrentes de suas campanhas antitabagistas. No entanto, apesar do sucesso do longevo Programa Nacional de Controle do Tabagismo, a doença ainda é uma das mais prevalentes e letais no país. Por outro lado, a imunoterapia tem emergido como uma abordagem promissora no tratamento de cânceres pulmonares e tem atraído a atenção de inúmeros pesquisadores. Esse é o caso de Thais Romano Ferreira, mestranda em imuno-oncologia no Einstein sob orientação do Dr. Kenneth Gollob e membro do Centro de Pesquisa em Imuno-oncologia (CRIO).

Ferreira investiga as diferenças nas células B e células T – responsáveis pela produção de anticorpos e ataque de células doentes, respectivamente – em pacientes diagnosticados com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) antes de iniciarem o tratamento com imunoterapia. Os CPCNP englobam os tipos de adenocarcinoma, relacionado a não fumantes, carcinoma de células escamosas, fortemente associado ao tabagismo, e carcinoma de células grandes. O câncer de células pequenas, responsável por menos de 20% dos casos, está quase sempre ligado ao consumo de tabaco.

Para a pesquisa, amostras de sangue foram coletadas de pacientes diagnosticados com CPCNP, que haviam participado de estudos anteriores conduzidos pelo grupo de pesquisa de Ferreira. Essas amostras foram coletadas inicialmente em 2018 e serão processadas para isolar as células B e T, permitindo a análise das diferenças em seus sistemas imunológicos antes do tratamento com imunoterapia que geralmente dura dois anos. “O objetivo é avaliar se existe uma diferença no perfil imune dos pacientes que vão responder ou não ao tratamento com imunoterapia para CPCNP. Essa descoberta poderá auxiliar médicos a tomar decisões mais informadas sobre o tratamento, evitando procedimentos ineficazes, custosos e com efeitos adversos”, comentou a mestranda em entrevista ao podcast Imuno Agentes.

O papel da imunoterapia no tratamento do câncer de pulmão

Os tratamentos convencionais para o câncer de pulmão podem incluir cirurgia como procedimento primário, seguido de quimioterapia ou radioterapia, dependendo do tipo e estágio da doença. Nos últimos anos, a imunoterapia emergiu como uma opção terapêutica promissora.

“Para tratamento de cânceres, como os de pulmão, a imunoterapia se concentra em desbloquear os “controles inibitórios” do sistema imunológico, conhecidos como checkpoints imunológicos. Normalmente, as células do sistema imunológico reconhecem as células saudáveis e doentes através de “fechaduras” e “chaves” específicas na superfície das células. No câncer, as células cancerígenas podem enganar o sistema imunológico. A imunoterapia utiliza anticorpos específicos para os checkpoints, como PD-1 e CTLA-4, para ativar as células T do sistema imunológico, que são as “células efetoras”, e fazê-las continuar a combater as células cancerígenas.”, ilustra Ferreira.

Em março de 2023, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) aprovou o uso do imunoterápico pembrolizumabe como tratamento adjuvante para pacientes com CPCNP em estágios iniciais da doença (IB, II e IIIA), após cirurgia e quimioterapia à base de platina. O medicamento foi incorporado no Sistema Único de Saúde (SUS) pelo Ministério da Saúde em 2020 e também tem sido utilizado em planos privados para o tratamento de diferentes tipos de câncer, incluindo melanoma e o de pulmão.

A imunoterapia pode tratar o câncer de pulmão a partir do desbloqueio de controles do sistema imunológico, utilizando anticorpos para ativar células T e combater células cancerígenas.

Embora a imunoterapia represente uma nova perspectiva no tratamento do câncer de pulmão, Ferreira ressalta que a decisão sobre o tratamento a ser prescrito dependerá de uma série de fatores individuais de cada paciente, como o estágio do tumor, o perfil imunológico, o estilo de vida e as características genéticas. Portanto, na identificação do carcinoma, é de suma importância seguir as orientações dos profissionais oncologistas e manter um acompanhamento médico contínuo ao longo do tratamento.

Cenário atual dos cânceres pulmonares no Brasil e no mundo

De acordo com estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA) para 2023, o câncer de pulmão é a terceira forma mais comum de câncer em homens (com 18.020 novos casos) e a quarta em mulheres (com 14.540 novos casos) no Brasil. A nível mundial, ocupa a primeira posição em incidência entre homens e a terceira entre mulheres. O tabagismo e a exposição ao tabaco continuam sendo os principais fatores de risco, contribuindo para cerca de 85% dos casos diagnosticados.

Além do tabagismo, cânceres pulmonares também podem estar relacionados à predisposição genética ou de origem ocupacional, frequentemente associada a condições de trabalho inadequadas, onde profissionais lidam com agentes químicos e poluentes como o asbesto, arsênico, berílio, cádmio, entre outros. Profissões de risco incluem agricultores, operários da indústria química e construção civil, trabalhadores de laboratório e mineradores.

Além disso, o aumento do tabagismo no Brasil tem sido motivo de preocupação entre especialistas. Um levantamento de 2022 feito pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria (IPEC) indica um significativo aumento no consumo de cigarros eletrônicos (os “vapes”) nos últimos quatro anos, vendidos ilegalmente no país. Estima-se que 2,2 milhões de adultos (1,4%) utilizaram esses dispositivos, um aumento expressivo em relação aos 0,3% registrados em 2018, com menos de 500 mil consumidores. Uma pesquisa do INCA demonstrou que esses dispositivos contêm substâncias tão tóxicas quanto os cigarros tradicionais, como nicotina, chumbo, monóxido de carbono e níquel, associados ao câncer de pulmão e outras doenças respiratórias e cardiovasculares.

Embora a prevenção do câncer de pulmão envolva hábitos saudáveis, como alimentação equilibrada, exercícios físicos e abstenção ao tabaco, Ferreira sugere que fumantes realizem exames regulares sob a supervisão de médicos clínicos e cardiologistas, como radiografias anuais do tórax. “Assim como a maioria dos tumores, o de pulmão é uma doença silenciosa. A maioria dos pacientes são assintomáticos, principalmente em estágios iniciais da doença. Quando alguns sintomas aparecem, como falta de ar, tosse frequente, expectoração com sangue, dor torácica ou cansaço incomum, é sinal que a doença pode estar avançada. Em alguns casos o tumor é diagnosticado por exames de rotina, e não algo que o(a) paciente tenha apresentado como queixa”, explica.

O SUS oferece tratamento gratuito para quem deseja parar de fumar. Interessados(as) podem procurar pela unidade de saúde básica mais próxima ou ligar no Disque Saúde 136 para maiores orientações.

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